Cartas de Iwo Jima (Letters from Iwo Jima, EUA/2006)



Vivemos num mundo onde a dicotomia está sempre presente. Corpo e Alma. Frio e quente. Alto e baixo. Gordo e magro. Bem e mal. Yin Yang. A história da humanidade não é diferente e, ao ser escrita, estipula divisões que orientam nossos olhares e definem papéis claros quanto a todos os participantes e envolvidos em fatos que merecem destaque através dos anos. Nas guerras, apenas para ficar num dos casos mais notórios desta dicotomia histórica, há sempre por juízo e análise, muitas vezes conduzida por ideologias dominantes, os mocinhos e os bandidos...

Foi assim com os pioneiros e os índios na conquista da América, na luta entre a “civilização” romana e os oponentes “bárbaros” ou, mais recentemente, nas Grandes Guerras Mundiais do século XX. Mas quem entre nós se atreve a ir mais longe e buscar o que há de mais humano tanto de um lado quanto de outro das cortinas que se abrem aos nossos sentidos através dos compêndios históricos?

Não há só vileza entre aqueles que foram derrotados e que, por isso, aparecem nos livros escolares como os “inimigos” da paz. Nem tampouco há só virtudes entre os “mocinhos” que lideraram aliados e permitiram a vitória da democracia e da liberdade. É nesta linha que surgiram, recentemente, alguns filmes de destaque no cenário internacional. Caso de produções premiadas como “Dança com Lobos” ou mesmo “As últimas horas de Hitler”, apesar de ser praticamente impossível defender o responsável pelo Holocausto de qualquer um dos inúmeros crimes que cometeu... Entre eles, destaque para as produções sobre a 2ª Guerra Mundial dirigidas em 2006, com maestria pelo astro Clint Eastwood, “A Conquista da Honra” e “Cartas de Iwo Jima”.

Tanto no primeiro, já analisado neste site, quanto no segundo, Clint nos coloca diante de homens comuns, como eu ou você - que têm família, prezam e defendem valores, se dispõem a lutar por sua pátria - mas que, do mesmo modo - sentem medo, fome, frio, insegurança...

Se em “Conquista da Honra” somos apresentados aos heróis que fincaram bandeiras e que se tornaram ícones de uma vitória importante e, por isso, se tornaram reféns de sua gloriosa performance, em “Cartas de Iwo Jima”, no mesmo cenário, a desolada ilha que abrigou uma das mais decisivas batalhas do Pacífico, acompanhamos os japoneses se preparando para uma verdadeira carnificina e, apesar disto, dispostos a lutar até a morte por seus ideais...

Kamikazes? Sim, mas a resposta afirmativa nos afasta de uma perspectiva mais realista daqueles soldados, disciplinados a força e que guardavam nos bolsos de seus uniformes as fotos de família, folhas de papel, lápis e cartas que recebiam para manter sua atitude, solidez (ao menos aparente), coragem e disposição (de vida e luta).

O filme de Clint Eastwood nos leva a considerar o lado de lá, coisa que raramente fazemos, até porque somos induzidos a isto... Pensamos o mundo sempre de olho em nossos umbigos e, nos esquecemos ou omitimos quanto a quem mora do outro lado da “cortina de ferro” e não comunga dos mesmos ideais de líderes despóticos, autoritários, expansionistas, preconceituosos...

Obra fundamental para pensar a guerra e também a vida, baseada em cartas enviadas por oficial japonês e soldados a seus familiares, “Cartas de Iwo Jima” é uma obra-prima do cinema e, certamente, é obrigatório!

Por João Luís de Almeida Machado

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