Robert Redford é realmente um homem admirável. Astro de cinema, com propostas sempre batendo a sua porta, resolveu ir além da carreira de ator e investir em projetos mais ousados. Criou o festival Sundance, para filmes independentes, com o intuito de promover o surgimento de uma nova geração de cineastas, dando-lhes o espaço que Hollywood e o Oscar não costumam dar. Tornou-se diretor e, para a surpresa de muitos, tem trazido a tona filmes que demonstram maestria tanto na condução quanto nas temáticas, sempre diferenciadas, questionadoras, polêmicas. Em seus filmes quer sair do lugar comum, incomodar, deixar os espectadores com dúvidas quanto a seus próprios posicionamentos e atitudes.
Este é o caso de "Leões e Cordeiros", estrelado por Redford ao lado de Tom Cruise e Meryl Streep, o que, por si só, já nos dá idéia de se tratar de um filme com grande potencial. Normalmente atores como Streep ou Cruise só colocam seus nomes em produções que venham a ter repercussão junto ao público e/ou a crítica.
Em "Leões e Cordeiros", os alvos são principalmente os espectadores, com especial predileção pelos norte-americanos, mas também passível de releituras e reinterpretações de acordo com outros contextos, como o nosso, o brasileiro.
É certo que as realidades apresentadas parecem distantes do nosso país, mas cinema e cultura em geral utilizam-se de metáforas até mesmo quando parecem tão evidentes, como é o caso de "Leões e Cordeiros", tão focado num universo aparentemente de compreensão exclusiva para os Estados Unidos e seus cidadãos.
No filme há três histórias que se cruzam, com a primeira tendo como protagonistas Cruise e Streep, respectivamente nos papéis de um ascendente senador da república, com claros objetivos de concorrer a presidência, e uma repórter liberal, que quer ainda ser questionadora e incisiva, mas que de súbito se percebe refém do sistema, das circunstâncias, da necessidade...
A relação entre eles é anterior a este encontro e foi marcada por uma reportagem de autoria dela que abriu portas e acabou levando o jovem político a ascender e ser reconhecido mais rapidamente por seus pares e pela sociedade. O ocorrido fez com que o senador, neste momento, recorra novamente a jornalista, oferecendo a ela a oportunidade de uma exclusiva, com informações importantes, a respeito dos rumos da guerra no Afeganistão. A promessa é a de que venha inclusive a revelar os próximos passos militares dos EUA na região...
Para que isso aconteça, no entanto, ele deixa claro que o sucesso da operação depende da forma como a idéia vai ser vendida pela imprensa ao grande público... Ou seja, torna-a cúmplice do governo ao aliciá-la através da oferta dessa matéria exclusiva, de caráter bombástico... Será que ela deve aceitar? E o jornal onde trabalha, vai permitir a ela que rejeite a oferta, afinal de contas, a informação sendo vendida como autêntico furo jornalístico daria mais crédito e aumentaria a lucratividade da empresa?
Enquanto isso, dois jovens estudantes universitários, decididos a marcar sua existência e cidadania, abandonam seus cursos e vão para a guerra, justamente no Afeganistão. Querem com isso comprovar sua tese, defendida perante colegas e professor, de que devemos fazer mais do que simplesmente pensar ou defender posturas. O imprescindível é engajar-se, participar, agir, realizar... E está em curso a segunda história, que corre em paralelo com as tramas narradas pelo senador a jornalista.
Enquanto isso, numa universidade norte-americana, um professor (Redford) se reúne com um de seus melhores alunos para convencer-lhe a dedicar-se mais aos estudos. Vê no jovem um enorme potencial, mas percebe que seu interesse caiu e que, um certo descaso em relação aos estudos surgiu no horizonte. Discutem educação, falam sobre a relação entre os estudos e a realidade, abordam política, debatem engajamento, questionam a guerra... Afinal de contas, diz o professor, não percebemos, mas o sistema a todo o momento nos compele a acomodação e, sem que percebamos, nos tira a consciência do dever que temos para com a comunidade, com o todo social...
São ricos debates que, certamente provocam os espectadores e fazem com que eles pensem todos os assuntos e tramas que correm paralelos. É um filme denso, com atuações fortes, diálogos marcantes e interpretações de peso dos astros Redford, Cruise e Streep. Cinema de Primeiríssima!
Por João Luís de Almeida Machado
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