Dúvida (Doubt, EUA/2008)


Reúna atores do quilate de Meryl Streep e Phillip Seymour Hoffman, conte ainda com o inestimável apoio de coadjuvantes do porte de Viola Davis e Amy Adams, tenha a frente das câmeras na direção e também como responsável pelo roteiro o talentoso John Patrick Shanley e como resultado teremos uma produção digníssima, envolvente e intrigante como Dúvida.

As aparentes convenções que surgem diante de nossos olhos quando começamos a assistir esta produção vão se dissipando rapidamente com o desenrolar da trama. Se parece muito óbvio a escola católica, dos anos 1950/1960, bastante conservadora e pouco afeita a aceitar e implementar mudanças que a sociedade está a lhe pedir, aguarde alguns minutos e situações nem um pouco tradicionais estão (ou não?) a acontecer nos bastidores...

Se por um lado temos a direção desta escola sendo conduzida a ferro e fogo por uma madre católica, a irmão Aloysius Beauvier, fervorosa e devotadíssima aos valores que realmente importam na educação de seus alunos, em interpretação novamente magistral de Meryl Streep... O contraponto é o padre Brendan Finn (Phillip Seymour Hoffman, irrepreensível), responsável por esta paróquia e também pela escola, ao qual ela deve obediência na hierarquia religiosa, progressista e orador afiado, com sermões que mexem com a audiência local.

Se nas salas de aula, com alunos pré-adolescentes controlados pela rígida disciplina da instituição religiosa, prevalecem freiras idosas, a proferir ensinamentos sem renovar quase nada o arsenal pedagógico que utilizam, conservador ao extremo... Há também o reverso da medalha com a sorridente, idealista e bondosa irmã James (Amy Adams), que tenta ser severa quando necessário, mas que carrega consigo a chama da caridade, da confiança e da fé cristã baseada nos modelos mais distantes daquilo que sua superiora deseja para tal instituição de ensino...

Se não bastasse isso, há uma novidade no ano escolar em curso: Pela primeira vez a escola tem um aluno negro e, na virada para os anos 1960, com a luta pelos direitos civis aumentando em todo o país, nada mais progressista do que aceitar também esta parcela da comunidade nos quadros escolares, não é mesmo? Mas em se tratando de uma escola e sociedade ainda conservadoras, o que estaria esperando por tal menino, ainda com seus 13/14 anos naquela nova instituição de ensino?

Ao perceber isso, Padre Finn resolve proteger o garoto, apadrinhando-o e dando-lhe algumas oportunidades, como atuar nas missas na função de coroinha. E é justamente nesta relação que se estabelece a tal "dúvida" do título... 

Filme pouco convencional, que nos insere num contexto bastante particular (o das escolas religiosas e da relação entre religiosos, apresentando suas disputas e quedas de braço) ainda que transferível para os tempos atuais, com ritmo compassado e adequado mais a música clássica ou barroca e não a batida techno-pop e ao rap de hoje em dia, Dúvida seduz pelos questionamentos levantados a cada novo passo dado pelos protagonistas, pela belíssima atuação dos protagonistas, direção firme e segura de Shanley e finalmente pelo roteiro inteligente e instigante. Confira!

Por João Luís de Almeida Machado

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